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Um Novo Pacto para as Migrações e Asilo na UE pretende mais solidariedade mas trará mais sofrimento

No dia 8 de junho representantes dos Estados-membros (EM) e o Conselho Europeu dos Assuntos Internos acordaram um novo Pacto para as Migrações e o Asilo, que havia sido apresentado em setembro de 2020 e que, desde então, tem estado em discussão para se alcançar um acordo. O entendimento chegou por insistência da presidência europeia sueca, apesar da oposição da Hungria e da Polónia e de outros quatro países que se abstiveram: Bulgária, Malta, Lituânia e Eslováquia. O acordo, considerado como histórico, irá ser agora votado no Parlamento Europeu e se for aprovado entrará como lei.

O acordo baseia-se em três pilares: responsabilidade, solidariedade e procedimentos. Segundo a Comissão Europeia, a proposta prevê criar um sistema de asilo europeu mais justo, eficiente e sustentável, com soluções comuns que garantam o equilíbrio entre a solidariedade e a responsabilidade dos Estados-membros em relação à migração e ao asilo. Mas para a diretora da Amnistia Internacional para a UE, com este novo Pacto "a solidariedade vai permanecer um conceito vazio". permitindo aos países europeus pagar para um fundo comum que pode ser utilizado para pagar a países fora da Europa para receberem as pessoas que procuram proteção e segurança na Europa. As autoridades podem, assim, enviar estas pessoas extremamente vulneráveis para qualquer país que considerem seguro, transferindo a responsabilidade para países fora da UE, por exemplo nos Balcãs ou no Norte de África, seguindo o conceito de "países terceiros seguros". Este método tem sido explorado por diversos países europeus, levando a acordos que muitos destes países terceiros não conseguem recusar, devido às vantagens quanto a apoios económicos, de cooperação, investimentos ou facilidades de vistos. Alguns destes países têm governos repressivos e instáveis, colocando em risco os direitos humanos. Adicionalmente, muitos destes países já assumem um grande compromisso ao acolherem a maioria dos refugiados, sendo que 76% são acolhidos em países de renda-baixa e 70% em países vizinhos. Adicionalmente, a solidariedade apregoada neste novo Pacto, ainda que obrigatória, é flexível, podendo os EM escolher como contribuem: através da recolocação de pessoas, podendo também ser pela capacitação, apoios ou contribuições financeiras.

Segundo o Conselho Europeu para os Refugiados e os Exilados (ECRE), o acordo foca-se nas fronteiras, tendo falhado quanto a um dos maiores problemas do sistema de asilo europeu: o regulamento de Dublin, que escapou ileso, continuando a causar pressão sob os países limítrofes, especialmente a sul e a leste da Europa. As reformas propostas vão na direção oposta às respostas que vimos serem implementadas aquando do deslocamento massivo da Ucrânia, que conseguiu aliviar e flexibilizar procedimentos, com um rápido acesso a proteção, permitindo que as pessoas pudessem trabalhar conseguindo uma autonomia mais rápida, assim como liberdade de deslocação pela Europa que possibilitou o reencontro de familiares e uma distribuição de responsabilidade mais equatitativa.

A Comissão propõe uma "verificação pré-entrada" para todas as pessoas que chegam a território europeu. Durante este processo, que pode durar semanas, as pessoas ficam alojadas em centros nas fronteiras, colocando em causa os seus direitos, como o acesso a serviços básicos e de representação legal. Com estas propostas os níveis de proteção de crianças nos procedimentos fronteiriços pioram, excepto para não acompanhados ou menores de 12 anos, indo contra a Convenção dos Direitos da Criança.

Menino sírio aguarda com a família em centro de detenção na Húngria.
Menino sírio aguarda com a família em centro de detenção na Hungria. UNHCR/ Mark Henley

Estas propostas trazem procedimentos mais complexos e lentos, podendo o processo de decisão levar até 2 anos, ou até 12 meses no caso de pessoas resgatadas no mar. Em vez de prevenir e dissuadir o tráfico humano, o novo acordo apenas permitirá que os traficantes exijam mais dinheiro pela longa e complexa viagem que as pessoas tomam desesperadamente.

Prevê-se que estas medidas provoquem mais sofrimento, levando a que mais pessoas fiquem presas ou detidas em centros fora das fronteiras da UE. Também se prevê que o número de pushbacks ou "devoluções" aumentem, levando muitos EM a escolher a opção "mais fácil". O novo pacto em vez de aumentar a solidariedade e proteger os mais vulneráveis, coloca o foco na externalisação, na dissuação, na detenção e no retorno, exacerbando a falta de solidariedade já existente, criando procedimentos mais burocráticos, dispendiosos e ineficazes.

São necessárias medidas que salvaguardem os mais vulneráveis e quem procura desesperadamente por segurança e paz, não tendo disponível qualquer rota ou opção legal para o fazer. É preciso aumentar a salvaguarda e os padrões dos direitos humanos e do asilo na Europa e não os padrões de retorno. Rotas seguras e legais devem ser ampliadas, aumentando as oportunidades de proteção e as vias complementares, apostando na reinstalação e no patrocínio comunitário.

O CPR e mais de 70 organizações a trabalhar no sector assinaram um comunicado a denunciar estas propostas e a pedir medidas mais justas e humanas para todas as pessoas que fogem de perseguições, de conflitos, da violência e de violações aos direitos humanos.


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