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Conheça as 10 maiores crises humanitárias que passarão mais desapercebidas em 2024

O número de pessoas deslocadas forçadamente tem mais do que duplicado na última década, batendo continuamente recordes históricos. Em meados de 2023 havia mais de 110 milhões de pessoas forçadas a fugirem de casa em todo o mundo, sendo que 36.4 milhões têm o estatuto de refugiados e 62.5 milhões estão deslocados dentro dos seus próprios países de origem. Quase metade dos refugiados vêem de apenas três países: Síria, Afeganistão e Ucrânia e mais de 75% estão acolhidos por países de renda baixa-média, com a Turquia e o Irão a acolherem ambos 3.4 milhões, seguidos sa Alemanha e da Colômbia ambos com 2.5 milhões. Todas estas pessoas tiveram de deixar as suas casas e as suas vidas para trás para fugirem de ameaças à sua vida. Não escolheram sair dos seus países ou localidades pois foram forçadas a fugir por circunstâncias fora do seu controlo.


Os conflitos na Ucrânia e em Gaza dominam as notícias atualmente mas não nos podemos esquecer que há muitos outros conflitos e crises que colocam milhares de vidas em perigo e que são facilmente esquecidos pelos meios de comunicação e pelo mundo. Em 2023, a resposta à diversas crises globais Os povos de Gaza e da Ucrânia não estão sozinhos. Estima-se que quase 300 milhões de pessoas, em mais de 72 países, vão precisar de ajuda humanitária e proteção em 2024. Seguem-se algumas das maiores crises humanitárias que se intensificaram em 2023 e que irão criar mais sofrimento, mais mortes e mais pessoas deslocadas.


Afeganistão

Cada vez mais dúvidas quanto à governação dos Talibã

Pessoas afetadas: 6.3 milhões de deslocados. 2.2. milhões refugiados. 23.7 milhões em necessidade de ajuda. 3.7 milhões de crianças retiradas da escola, incluindo 2.2 milhões de meninas.


Anunciado em 2023 (antes da escalada em Gaza) como a maior crise humanitária do mundo pela ONU, o Afeganistão saiu do radar dos média internacionais desde que o Talibã retomaram o poder em agosto de 2021. Embora o deslocamento forçado relacionado com o conflito desde a retirada das forças ocidentais tenha reduzido drasticamente, o país ainda enfrenta os efeitos de mais de quatro décadas de guerra, dos crescentes choques climáticos e de um governo Emirado Islâmico que continua a ser acusado de violações dos direitos, ao mesmo tempo que é sancionado e condenado ao ostracismo pela maior parte da comunidade internacional. Depois de uma série de terramotos devastadores em Herat, em Outubro e das recentes expulsões de centenas de milhares de afegãos pelo vizinho Paquistão, muitos questionam-se sobre o futuro da governação Talibã. Embora os debates tenham aumentado, críticos e defensores dos direitos humanos querem ver mais progressos nos direitos das mulheres antes que questões como a retenção diplomática, as reservas congeladas do banco central afegão e as sanções aos líderes talibãs sejam reconsideradas.


Pessoas pedem desesperadamente por comida no Afeganistão. Reuters via VOA News.

Corno de África

Conflitos, inundações e rivalidades sobre o Mar Vermelho

Pessoas afetadas: Na região do Grande Corno de África 49 milhões sofrem de insegurança alimentar aguda. Mais de 19 milhões de deslocados. Mais de 967 mil refugiados da Etiópia. Mais de 580 mil refugiados da Eritreia. Mais de 150 mil refugiados da Somália. Mais de 865 mil refugiados acolhidos, maioritariamente na Etiópia.


Os conflitos nesta parte do mundo estão-se a transformar. O acordo de paz entre o governo da Etiópia e a região do Tigré dura há mais de um ano, mas permanecem obstáculos e combates eclodiram nas regiões Amhara e Oromia. A ofensiva da Somália contra o grupo extremista islâmico Al-Shabab parece ter estagnado após alguns ganhos iniciais, enquanto os esforços regionais para travar a guerra no Sudão estão a ter um impacto limitado. As rivalidades no Mar Vermelho também estão a aquecer: as ambições portuárias da Etiópia, sem acesso ao mar, levaram a um acordo com a costa da Somalilândia - uma região separatista da Somália. Mogadíscio, que vê a área como parte do seu território, anulou simbolicamente o acordo e referiu-se a ele como um “ato de agressão” que viola a sua soberania. Além destes conflitos, os efeitos dos fenómenos naturais estão a fazer-se sentir. Após uma seca histórica, grandes partes do Corno de África enfrentaram recentes inundações catastróficas. Cerca de 2 milhões de pessoas ficaram deslocadas quando aldeias inteiras foram devastadas pelas chuvas induzidas pelo El Niño.


O exército etíope toma controlo de várias regiões. Minasse Wondimu Hailu/AA/picture alliance/AA

Haiti

A intervenção internacional pode piorar ou melhorar a situação no país

Pessoas afetadas: 200 mil pessoas deslocadas. Mais de metade da população do Haiti – cerca de 5,2 milhões de pessoas – necessita de assistência e protecção humanitária. Mais de 4 mil pessoas foram mortas pela violência de gangues em 2023, um aumento de 80% em relação a 2022. As violações e a violência baseada no género atingem níveis sem precedentes.


A violência de gangues estrangulou o Haiti desde o assassinato do presidente Jovenel Moïse, em julho de 2021. À medida que os assassinatos e as violações continuam a aumentar na capital – e a espalhar-se por outras partes da nação caribenha – forças apoiadas pela ONU ficaram adiadas por desafios legais no Quénia, mas poderá chegar ainda este ano para tentar reprimir a violência. Neste momento, o Haiti não tem representantes eleitos e muitos temem que qualquer força armada estrangeira que consiga controlar os gangues, continue a apoiar as elites políticas e financeiras corruptas do Haiti. Entretanto, as necessidades humanitárias estão a aumentar, num país onde o acesso à ajuda é extremamente difícil de negociar. Cerca de 200 mil pessoas foram deslocadas – uma situação que se agravou desde que 115 mil haitianos foram deportados de outros países em 2023. Cerca de 3.3 milhões de haitianos não têm acesso a água potável e, em alguns distritos da capital, quase todas as pessoas sofrem de fome severa e só recebem água potável e uma refeição (ou menos) por dia.


Protestos na capital haitiana contra a intervenção militar estrangeira. Richard Pierrin/AFP via Getty Images

Iémen

Ataques dos Houthi no Mar Vermelho ameaçam uma perspectiva de paz

Pessoas afetadas: 21.6 milhões em necessidade de ajuda humanitária. 4.5 milhões de deslocados. Mais de 377 mil mortos no conflito.


Durante quase dois anos, os rebeldes Houthi do Iémen e o governo da Arábia Saudita – que apoia o governo internacionalmente reconhecido do Iémen – têm discutido o fim do conflito. Estas conversações nos bastidores produziram alguns frutos, mas não a paz e as tentativas dos Houthis de se juntarem ao conflito entre Israel e o Hamas, atacando a navegação comercial no Mar Vermelho, têm o potencial de mudar mais uma vez a dinâmica. Entretanto, a enorme crise humanitária do país continua: o Iémen enfrenta outro surto de cólera que se espalha rapidamente, e o Programa Mundial Alimentar anunciou no final de 2023 que iria suspender a sua assistência alimentar geral no norte do Iémen - governado pelos Houthi - devido ao baixo financiamento e a um colapso nas negociações. com as autoridades sobre quem deve receber ajuda. As ONG que trabalham no país, que já lida com o problema da fome há muitas décadas, alertam que a suspensão “exacerbará a já crítica situação humanitária, afetando desproporcionalmente as populações mais vulneráveis, incluindo crianças, mulheres grávidas e idosos”.


Criança entre os escombros da sua cidade Taiz, Yemen. Akramalrasny/Shutterstock


Myanmar

Revoltas contra a junta trazem alguma esperança

Pessoas afetadas: 2.5 milhões deslocados. Mais de 70 mil refugiados. Pelo menos 23 mil mortos desde o golpe de estado de 2021.


Pela primeira vez desde que o governo liderado pelos militares assumiu o poder total em Fevereiro de 2021 – prendendo Aung San Suu Kyi, cujo partido tinha obtido uma vitória eleitoral esmagadora meses antes – dezenas de grupos armados estão a unir-se para enfrentar a junta e ganhar o poder. Enquanto alguns vêem os ganhos destes grupos, que totalizam mais de 250, como um sinal de que a junta está finalmente em desvantagem e esperam que um dia possa levar à sua queda, outros temem que a resposta violenta dos militares apenas conduza a um aumento das necessidades de ajuda humanitária, num país que já recebe muito pouca atenção global. A curto prazo, esta última situação já se manifesta, uma vez que mais de 660.000 pessoas foram recentemente deslocadas desde que os combates se intensificaram no final de Outubro. Este número acresce aos mais de 1 milhão de refugiados Rohingya que conseguiram escapar de uma das perseguições mais violentas que se intensificou a partir de 2016 e causou mais de 25 mil mortos.


Grupo de Rohingyas foge do alegado genocídio no Myanmar. Paula Bronstein/Getty Images

República Democrática do Congo

Número recorde de pessoas forçadamente deslocadas face à retirada das forças de manutenção da paz

Pessoas afetadas: Quase 7 milhões de deslocados internos. Mais de 25 milhões com níveis críticos de insegurança alimentar. Mais de 1 milhão de refugiados. O país acolhe mais de 500 mil refugiados.


A crise de deslocados na República Democrática do Congo atingiu um recorde de 6,9 milhões no ano passado, prevendo-se um aumento neste número dado o agravamento da situação logo no ínicio deste ano. O Presidente Félix Tshisekedi foi declarado o vencedor esmagador das eleições de Dezembro, mas os candidatos da oposição exigem uma nova candidatura, alegando diversas irregularidades. Entretanto, uma missão de manutenção da paz da ONU de longa data está a acelerar a sua retirada, logo quando a situação de segurança se está a deteriorar. Os combates têm sido especialmente intensos no leste entre o grupo rebelde M23 - apoiado pelo Ruanda - e o exército congolês que é apoiado por milícias locais e mercenários estrangeiros. Os civis também enfrentam situações de insegurança alarmantes na região nordeste de Ituri e em toda a sofrida Kivus.


Milhares de congoleses fogem da vila de Sake com o intensificar do conflito na RDC. Lynsey Addario/The New York Times

Sahel Oeste

As insurreições jihadistas aumentam sob o controlo da junta

Pessoas afetadas: 8.8 milhões de pessoas precisam de assistência no Mali, com quase 400 mil deslocados internos. 3.7 milhões de pessoas necessitam de assistência no Burkina Faso, com mais de 2 milhões de deslocados internos. 4.3 milhões de pessoas necessitam de assistência no Níger, com cerca de 335 mil deslocados internos. Milhares de mortos pelos conflitos.


As insurreições jihadistas e a instabilidade política estão a agravar-se no Burkina Faso, no Mali e no Níger, três países vizinhos situados no Sahel. Os líderes militares tomaram o poder no Níger no ano passado, o que significa que as juntas governam agora toda a região. Gozam de apoio local significativo, mas estão diplomaticamente isolados. Os ataques jihadistas continuaram no Níger após o golpe e as sanções impostas ao país pela Comunidade Económica dos Estados da África Ocidental (CEDEAO) estão a causar dificuldades a nível nacional. A junta do Burkina Faso interrompeu os esforços de diálogo com os jihadistas a favor de uma “guerra total” e os insurgentes estão a impor cercos às comunidades que apoiam o exército. Entretanto, no Mali, a junta iniciou uma missão de manutenção da paz da ONU com a duração de uma década e deu início a uma nova guerra perigosa com os grupos armados dominados pelos tuaregues que operam no norte.


Soldados controlam postos de votação no Mali. Philip Kleinfeld/TNH

Síria

O agravamento da situação à medida que a atenção esmorece

Pessoas afetadas: 15,3 milhões necessitavam de ajuda antes dos terramotos de Fevereiro. 120 mil deslocados pela violência desde Outubro 2023, somando-se à “maior crise de deslocamento no mundo” que já criou mais de 13 milhões de deslocados forçados, incluindo


No início de 2023, as necessidades humanitárias na Siria já atingiam um nível recorde devido ao colapso económico, às alterações climáticas e a uma guerra há muito não resolvida. No final do ano, as coisas estavam muito piores. Uma série de terramotos massivos atingiu o sudeste da Turquia e o norte da Síria no início de Fevereiro, matando mais de 4.500 pessoas na Síria (bem como mais de 50.000 na Turquia), destruindo ou danificando dezenas de milhares de casas e afectando milhões num país onde a maioria já estava em crise. Em Julho, o Conselho de Segurança da ONU não conseguiu renovar uma resolução que permite a ajuda através da fronteira Turquia-Síria, o que significa que o acesso a esta parte do país controlada pelos rebeldes depende agora da permissão do Presidente Bashar al-Assad. Em Outubro, o governo sírio e os seus aliados russos começaram a bombardear alvos em Idlib, numa grande escalada que matou civis e forçou 120 mil a fugir das suas casas. Acrescenta-se a isto um surto de cólera e um financiamento humanitário tão baixo que o Programa Alimentar Mundial afirma que irá interromper a sua assistência alimentar geral em Janeiro de 2024. As perspectivas são, agora, mais do que preocupantes.


Casal passa pela cidade de Alepo totalmente destruída. Natalia Sancha

Sudão

Uma limpeza étnica que está a criar a maior crise de deslocados internos no mundo

Pessoas afetadas: Mais de 7 milhões deslocados. 25 milhões (mais d metade da população) em necessidade de ajuda humanitária. Pelo menos 12 mil mortos em 2023 pelo conflito.


O conflito que eclodiu em Abril entre o exército sudanês e as Forças paramilitares de Apoio Rápido (RSF) criou a maior crise de deslocados internos no mundo. Mais de 7 milhões de pessoas abandonaram as suas casas, incluindo 1,5 milhões que fugiram para o estrangeiro. Cartum foi devastada e a RSF é acusada de limpeza étnica e crimes de genocídio em Darfur. Os esforços de mediação falharam e as organizações de ajuda humanitária enfrentam um dos ambientes operacionais mais inóspitos do mundo, para além de financiamento limitado. Os grupos de ajuda mútua sudaneses são os principais responsáveis pela resposta humanitária, mas receberam pouco apoio de doadores internacionais e vários tiveram de interromper o seu trabalho. Os receios de que o Sudão esteja a enfrentar uma divisão ao estilo da Líbia, entre o oeste controlado pela RSF e o norte e leste controlados pelo exército, estão a dar lugar a preocupações de que a RSF – que está numa ofensiva diplomática à medida que consolida a sua vantagem militar – está à procura do poder total.


Homem sudanês passa pelo acampamento improvisado na fronteira entre o Sudão e o Chade. Zohra Bensemra/Reuters.

Venezuela

Poucas esperanças para um clima político mais calmo um 2024

Pessoas afetadas: Mais de 7 milhões de pessoas fugiram do país e 84% encontram-se como refugiados ou migrantes na América Latina, dos quais 5 milhões precisam de ajuda humanitária e 7.7 milhões precisam de ajuda dentro da Venezuela.


A decisão do presidente Nicolás Maduro, em dezembro, de anexar a região de Essequibo, rica em petróleo, na Guiana, foi apenas a mais recente de uma série de acontecimentos no final de 2023 que diminuíram as esperanças de um fim à crise política, humanitária e económica que levou mais de 7 milhões de venezuelanos a fugirem desde 2015 e que deixaram os 28,7 milhões restantes enfrentando uma hiperinflação, serviços de saúde destruídos e fome. O governo de Maduro assinou um acordo em Outubro com a oposição para preparar o caminho para eleições livres e monitorizadas em 2024 – isto incluiria o levantamento das sanções dos EUA sobre a outrora poderosa indústria petrolífera da Venezuela. Poucos dias depois, a ONU concordou em gerir um fundo fiduciário para descongelar activos sancionados da Venezuela no estrangeiro, para responder às necessidades humanitárias. Mas à medida que a oposição ganhava força, Maduro procurou reafirmar o seu poder, prendendo líderes importantes. Juntamente com a medida de anexar Essequibo, isto corre o risco de uma reimposição de sanções dos EUA, desestabilizando a região e exacerbando, mais uma vez, as enormes necessidades humanitárias da Venezuela.


Protestantes em confrontos com a Guarda Nacional venezuelana em San Cristobal. Carlos Eduardo Ramirez/Reuters.

Adaptado do artigo "Why these 10 humanitarian crises demand your attention now" do The New Humanitarian.

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